quarta-feira, 6 de maio de 2009

Reflexão de estágio (muito antiga)

Chegamos aproximadamente a 1 da tarde, as crianças estavam com o professor de educação artística, o que nos deu a oportunidade de conversarmos com a professora na sala dos professores na frente dos novatos do segundo ano de pedagogia.
Confesso que foi um exercício interessante à objeção inicial a nosso primeiro planejamento da professora, pois assim, pensamos nos argumentos, na consistência teórica de nossas afirmações e pudemos efetivamente ter um processo de troca real com uma escola que se encontra inserida na realidade de uma cidade de médio porte no Brasil.
Vinculei rapidamente, o que estávamos fazendo ao apresentar a professora da sala de estágio o plano de intervenção, com um discurso apodíctico, cuja obrigação era apenas defender um ponto de vista, e não tratar da verdade. Mas ao mesmo tempo ocorreu-me a idéia de um professor novato que visava adaptar a sua idéia de escola e docência com a prática e a realidade. Em todo o esforço de elaboração de autocrítica e outros.
Somente neste instante é que percebi o por que a escola gera um conhecimento próprio de seu ambiente (escolar) e não apenas reproduz padrões sociais. No momento da demonstração, da pesquisa, da aplicação do plano de aula com as crianças na cristalização destes componentes em uma única aula se produziu uma obra única, não podendo ser reproduzida exatamente com os mesmos personagens. Por fim, não ficamos presos as nossas observações limitadas, mas sofremos o embate, o impacto da negativa, tivemos que fazer do diálogo uma ferramenta não de convencimento somente como também um instrumento de adaptação e reformulação.
A intervenção em si foi bem tranqüila, as crianças com maiores dificuldades tiveram nossa atenção e conseguimos fazer com que todos produzissem um texto (bilhete) escrito, fizemos questão que as crianças assinassem os seus bilhetes, que se debatem com conflitos, como não gostar do colega e ter que escrever para ele. Retomamos o filme e construímos um material juntamente com as crianças com muita tranqüilidade. Fizemos os combinados da sala para que na sexta tanto a professora, quanto às crianças esperassem a correção dos bilhetes e se preparassem para a construção escrita de um texto maior ao Grinch.
Continuo com questões quanto ao modelo de escola defendido pela direção e professora, acredito em algo mais livre, ensinar as responsabilidades da liberdade e seus custos para as crianças é algo primordial ainda.
Muitas crianças perguntaram sobre o quê eles deveriam escrever, mas a questão era na verdade o conteúdo, tanto o Paulo quanto eu deixamos que eles criem as hipóteses e as colocassem por escrito, limitamos nossa exemplificação a um pequeno bilhete colocado na lousa, que demonstrava, entretanto, não dava as respostas às crianças.
Fico ainda me perguntando como é preparar para a vida e seu longo e continuo processo de escolhas, e como ser um professor democrático e mediador do conhecimento tal como o saber é. Quais as competências e habilidades que devemos, não por aspecto legal, ensinar. Os índios no amazonas deveriam ter na caça e pesca uma matéria fundamental a ser ensinada, mas quais os conteúdos que nos, pós-modernos, pós-punks, pós-guerra mundial devemos ter? (Eu lembrei um texto do Elmir que os índios americanos falam das crianças brancas e oferecem ajuda para ensinar as crianças brancas a serem verdadeiramente homens, acho que ele deu essa aula para a biologia). O que importa é o que devemos ensinar e o que as crianças devem saber, então, voltamos ao saber fazer, saber ser enfim saber.
A sociedade pela mídia, pela família, pelo trabalho e pelas outras relações não ensina a viver, contudo a sobreviver. Entretanto, estamos em paz e o conflito entre classes não ultrapassou o nível teórico. Os não abastados sobrevivem e os ricos são cheios de pecados capitais, não se ensina a força de viver, a potencia para vida, a manifestação, o cuidado com o cidadão, com a coisa pública, com seu povo.
Fiquei em dúvida em ensinar história como eu aprendi, com nomes, datas e os processos de heróis, mas não confio em um ensino a partir de uma vivência particular. Também vejo a ciência como algo extremamente interessante para se ensinar a escrever bem, a interpretar textos e fenômenos naturais ou biológicos. A descrição, a narrativa e a dissertação estão na tese das ciências destes seus primórdios. Então, Chapeuzinho Vermelho é tão importante como ensinar a gravitação universal de Newton e as aulas de português poderiam ser permeadas com mais conhecimento cientifico e menos mítica ou folclore (ou com mais equilíbrio). Acho que estou defendendo uma escola ou planos de aulas por projetos: relógio de sol, experimentos de física e biologia e depois teatro, dança e música. Não sei o volume de trabalho disso que falei... (risos).

Fabio At Visioli.

Reflexão livre: palestra XXXX sobre deficiência e relações com a leitura de Kerouac.


De certa forma Aristóteles me dá a sobriedade que preciso para viver e compreender o mundo sensível, a política, os homens e a falar com lógica meus discursos, mesmo que mentais ou verbais apenas. Em antíteses a esse processo, mas não menos iluminado e brilhante, Kerouac traz a loucura, a escrita rápida, quase sem fôlego de alguém que não crê, e ainda assim, vê a realidade (e a entende) suficientemente para registrá-la. Sonhos, delírios, geração perdida?
O que resta, então, é uma mistura e um pingo de crença que a metafísica existe, que ainda podemos voar, por mares de vinho e quem sabe dançar ao som de tango comemorando o surgimento do Baco pós-moderno.
Poderíamos também levantar um assunto a muito morto (pelo menos para mim); a questão da ciência e da prova: o que seria evidência? o que é então pensamento legítimo que deve quando transmitido refletir uma verdade provável? Prefiro, os sofistas pela beleza, prefiro os detetives como Holmes, pois ao observarem um sinal percebiam as conexões dos temas de maneira transversal, não se limitando a um campo de batalha, de luta e explicação. Os assassinos e suas histórias poderiam sim ensinar ao cientista em como solver um problema, portanto.
Deste modo, me deparo com uma questão, ou várias, se há um limite, a humanidade sempre se colocou a produzir para superá-los? Vamos relembrar quando vimos o mar intransponível e a aventura humana que se constituiu nas grandes navegações, devemos também (somente para ficar em dois exemplos) da censura das ditaduras e o avanço (que geralmente) ocorriam nas artes e na política como representação da luta democrática.
Concluo, então, que as deficiências são limitações, e que as limitações colocaram o engenho humano para a produção, com sua conseqüente superação. Resta uma pergunta. Pode o deficiente produzir? Respondo que sim, se colocado a frente de sua limitação e estimulado, ele (ou ela) por ser do gênero do homem e estar imbuindo de alma (aqui me remetendo aos gregos) produzirá cultura, arte, ciência, valor (tanto ético quanto econômico e político).
São os sonhos descritos no livro de Kerouac (no O livro dos sonhos) somente delírios? Também respondo, e digo não, são representações do real, mas colocam outras possibilidades descritivas, de narrativas e enfim, de lógica. Ultrapassando o limite imposto do real e produzindo, neste caso, arte.
São os dilemas metafísicos, barreiras para o desenvolvimento, se considerarmos certas ideologias? Sim, e por causa justamente de serem barreiras, constituem-se em estímulos para a criação, para imaginação, convergência.
Logo, o custo econômico que justificaria a não atenção aos limites do indivíduo, de fato, impõem um controle cruel e frio, que rebaixa o sujeito a carne, órgãos e estímulos sem coesão. E isto, carne, somos todos e justificaria se aplicar tal controle a toda sociedade, já que de certo modo somos todos limitados? Estaríamos uniformizados em uma das piores amarras, a mental. Não sonharíamos e, portanto, não ultrapassaríamos os mares, nem lutaríamos contra ditaduras, não comporíamos o mosaico criativo que é o essencial humano.


Fábio
23/04/09